a posteriori
é porque te quero, meu quentinho. só por isso.
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sobre lapidar
... deixo-te todo esse meu carinho. carinho este que cresceu do nada numa estranha e ébria noite de quinta-feira. e na sexta se manifestou numa centelha. e no sábado já era visível. no domingo fez-se notar. e hoje, é tão grande que não sabe se esconder.
Antes de você ir embora...
... deixo-te um pouco das minhas lembranças. das tardes quentes de preguiça. do vinho derramado. do quarto imaculado. do drink ofertado. da boca manhosa e pedinte. do querer sem limites.
Antes de você ir embora...
... peço-te ainda um pouco mais dessa sua doçura. dessa que você nunca nega. dessa que você me oferece antes mesmo de eu pedir. dessa que vem nos dias amargos como remédio e cura. essa doçura só tua, que fiz raptar.
Antes de você ir embora...
... escrevo-te uma carta dizendo que saudade é coisa pouca perto do que virá. e ouço-te dizer que o que virá, ninguém sabe, nós não sabemos. mas eu queria que o porvir nosso fosse fruta na árvore. queria colher nossos planos. queria ver suas sementes.
Antes de você ir embora...
... escondo-te minha vontade de pedir que fique. dos meus gritos de revolta e fúria. meu apelo que parece medo, na verdade é puro amor. amor bruto. é tanto amor que espero com desespero que você não vá. e que se for, não volte para me fazer chorar.
"O amor se torna maior e mais nobre nas calamidades..." [ Gabriel García Marquez ]
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quando sentir não for pensar
"Ali fui mártir; Fui réprobo, fui bárbaro, fui santo; Aqui encontrarás minhas pegadas; E pedaços de mim por cada canto." [ Vinicius de Moraes ]
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no verde das folhas
Escrevo e erro.
Constantemente. E abundantemente.
E só.
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torre invertida
- Sinto sua falta.
- Tá tudo bem?
- Não. Tive um dia péssimo. Tô meio triste, meio só.
- Quer conversar?
- Quero carinho... Posso ir na sua casa?
- Amanhã eu tenho que acordar cedo, preparar umas provas, fazer uns slides.
- Entendo...
- Mas você pode falar. O que te aflinge?
Isa desligou. Não era isso que ela queria. Uma conversa informal pelo telefone sobre seu dia, seus problemas, seu mundo. Isa queria mais. Isa queria a proteção, queria o calor do abraço, o colo. Isa queria aquilo que Gustavo sempre deu sem pedir. Mas o pedido, assim tão explícito, tão eufórico fez parecer claro, o natural. Gustavo esquivou-se. Isa não insistiu, embora a vontade de dizer poucas e boas tenha subido à garganta. Queria dizer-lhe que tantas vezes ele a chamou para sua casa, para o prazer, para a conversa, para o filme e pizza fria. Tantas e tantas vezes, na chuva, ela dispôs-se a segui-lo. A amá-lo. E agora, Gustavo, sem dó, retirou sua sombra fresca. Isa não se irritou, tampouco se admirou. Isa conhecia bem a fugacidade dos trejeitos de Gustavo. E sabia ainda mais que ela não era mulher pra ele, e que ele não era homem suficiente pra ela, ainda que os dois se entendessem muito bem. E se gostavam. Divertiam-se do humor seco de cada um. Tinham lá suas afinidades. Usavam o mesmo xampu. Mas Gustavo era de fogo e Isa era de água.
- Isa, quer vir? Te faço um café gostoso, daqueles que você acorda pedindo...
- Vou me vestir. Me espera.
Isa quebrou o limite. Mas o limite ainda está lá. Intacto e agora não mais escondido, oculto. O limite está expresso. E Isa espera. Não sabe se o ultrapassa, não sabe se o esquece. Não sabe o que espera. Mas espera. Isa se expande, mesmo com todos os limites.
"Não quero saber do sofrimento, quero é felicidade. Não gosto de fazer lamúrias. Uma vez, discuti feio sobre determinada situação. Fiquei sozinho em casa, cheio de razão e triste pra cacete. Então, pra que querer ter sempre razão? Não quero ter razão, Quero é ser Feliz!" [ Ferreira Gullar ]
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outra direção
"A sensação de arrepio, o medo do novo, a náusea — Aquela náusea que é o sentimento que sabe que o corpo tem a alma..." [ Fernando Pessoa ]
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quem havia de dizer
"E quando, de repente, atravessando a mesma rua engarrafada, a gente se encontrar, eu sei que você vai imaginar que como fazem na tv, uma canção romântica há de vir no ar, selar o encontro que o corpo sente e o coração aos pulos quer viver..." [ Oswaldo Montenegro ]
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travessia
"Eu sempre sofri em silêncio, - e o silêncio nos faz sofrer mais profundamente." [ Kahlil Gibran ]
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o vazio que cabe
"(...) e eu lhe respondi que não fazia nada mais que estar vivo, porque tudo o mais não valia a pena." [ Gabriel García Marquez ]
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o que me falta é o que me basta
Não importa o que fizeram com você. O que importa é o que você faz com aquilo que fizeram com você. [ Sartre ]
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o labor das línguas
"Acordei hoje com tal nostalgia de ser feliz." [ Clarice Lispector ]
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corre e olha o céu
"Pouca sinceridade é uma coisa perigosa, e muita sinceridade é absolutamente fatal." [ Oscar Wilde ]
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o amargo
“Cuidado com as ilusões, mocinha, profundas e enganosas feito o mar que é teu elemento.” [ C. F. Abreu ]
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o doce
“Coisas assim, algumas ferem, mesmo essas que são bonitas.” [ C. F. Abreu ]
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nunca demora
"Sou o que falho." [ Fabricio Carpinejar ]
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"gosto do que começa com j"
"Não me peçam para dizer quem sou e não me peçam para não mudar." [ Michel Foucault ]
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história da vovó #1
Em abril de 1958, ao chegar no Rio, instalou-se num quartinho alugado na casa de seu Ananias. Era uma casa simples no subúrbio da cidade, mas por ora estava bom. Enquanto preparava sua voz no banheiro contíguo, Persival viu um vulto pela janela. Pôs se a olhar. Era Leda da Rocha, filha de seu Ananias. Era baixa, de curvas largas e fartos seios, possuía bochechas rosadas e um sorriso automático. Sorriso este que, mais tarde, descobriria que sempre viria com muitos palavrões.
Leda era desbocada e independente. Embora muito nova, saía falando sobre todos os assuntos, sem filtro algum. Caçoava das pessoas, mesmo daquelas que não conhecia. Defendia o pai com unhas e dentes e se pusessem a falar mal dele, ela soltava os palavrões. Pois não houve remédio: Persival ficou perdidamente apaixonado por Leda. Embora bem mais nova e mais cheia que as meninas da sua idade, ele não pode conter a atração que ela exercia. Era tão solta!
Passava os dias a observá-la. Ela espiava por vezes, mas sequer lhe dava atenção. Não fazia o seu tipo. Mas Persival não desistia. Fazia-lhe poesias que ela aceitava de bom grado. Dizia que eram muito bonitas, depois jogava fora e saía a andar com seu jeito desdenhoso. Dedicava-lhe músicas na rádio que ela vivia cantarolando pelos cantos da cozinha, mas, geniosa, nunca agradecia.
Um dia, Leda se arrumou toda para o show do Cauby Peixoto que ia ter no teatro próximo. Persival ardeu de ciúmes. Puxou-a no canto e proibiu-a de ir. Disse que ela era dele e de mais ninguém, e que esses concertos não eram apropriados para uma menina como ela. Ela riu-se alto e provocador. Mal deu-se o trabalho de responder. Saiu andando para encontrar as amigas.
Leda, no meio do show foi chamada às pressas pelo seu irmão. Algo de muito grave tinha acontecido! Saiu enjuriada porque iria perder metade da apresentação, mas foi então que seu irmão falou apressadamente: Persival tinha tentado se matar! Mas o que ela tinha a ver com isso, oras? Fora do teatro, seu pai já a esperava no carro para levá-la para a casa de sua tia. Comunicou, por fim, que Persival tinha deixado um bilhete que falava no nome dela.
Leda nunca soube realmente o que havia escrito no bilhete. Sua mãe ao ver tamanha desgraça rasgou e queimou-o imediatamente. Soube, contudo, que Persival fracassou ao cortar os pulsos. Não morreu. E foi expulso da casa de seu Ananias. Leda ficou um bom tempo escondida na casa dos tios. Tempos depois, Persival mudou-se para perto dela e volta e meia parava-a na rua para lhe dizer de amor e morte. Leda nem ligava! Soltava o braço e saía a andar displicentemente pela rua soltando palavrões e risadas estrondosas.
Em homenagem à minha avó Leda com suas histórias reais sempre com muito sabor.
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sucessão
"Seu maior medo era o destemor que sentia. Íntegro, sem mágoas nem carências ou expectativas. Inteiro, sem memórias nem fantasias. Mesmo o não-medo sequer sentia, pois não-dar-certo era o natural das coisas serem, imodificáveis, irredutíveis a qualquer tipo de esforço. " [ C. F. Abreu ]
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outras aflições
Procurou suas roupas. Estavam sujas de um grená escuro do vinho que tanto derramara no meio de tantas risadas escandalosas. Pegou uma bermuda bege dele – quem era ele? – e enrolou-se numa toalha branca que estava pendurada na parede e foi ao banheiro.
Ligou o chuveiro. Não sabia se era permitido tomar banho na casa dos outros, mas estava se sentindo suja de vinho e de mentiras. Ficou com uma certa ojeriza de usar o sabonete dele, ou deles, não sabia mais quem morava naquela casa – que não sabia se era no Catete ou no Recreio -.
A ducha era forte e caiu como uma pedra nas suas costas de ressaca. Foi bom, pensou Ana. Organiza as idéias. Aos poucos, foi-se lembrando de ontem. Do encontro no bar Bukowski. Do “Posso te pagar uma bebida?”. Que bebida era aquela mesmo? Deliciosa! Ele a conquistou com aquela bebida. Não deixou transparecer, claro. Fez cara de pouco caso. Depois falaram de Albert Camus. De Fernando Pessoa. De Roberto Carlos. E quando viu, já estava no táxi indo pra casa dele para “tomar um vinho, gata.” Um vinho, que mal faria? Ele disse que ia mostrá-la um disco do Cartola. Um livro de poesias inéditas “Inéditas?” “Sim, inéditas!” do Vinicius de Moraes. Uma coletânea em off, disse ele.
A casa dele era simpática. Estilo intelectual-francês. Havia um violão no canto do sofá. Uma garrafa térmica em cima da mesa. Livros, muitos deles. E uma vitrola que deixou de funcionar justo aquele dia! Uma pena...
Lembrou-se de algumas palavras mansas dele, dessas bem aveludadas que por trás, pelos lados e frestas dizem essas coisas sensuais que a gente finge que não entende. Ana riu sem querer. Gostou dele. Dos cabelos principalmente. Desleixados. Usava uma camisa branca. “O branco lhe cai bem”. Ele riu. “O vermelho também lhe cai bem.” Estava de verde. Mas deixou pra lá.
Fechou o chuveiro. Enxugou-se com a toalha que já estava meio suja, e não sabia de quem era. Dele? De um outro alguém? Havia vários colchões no quarto, talvez mais pessoas morassem ali. Que seja!
Entrou no quarto, ele ainda dormia dessa vez mais profundamente. Respiração forte. Resolveu vestir sua roupa suja. Já era dez e o sol lá fora, embora fosse inverno, estava se impondo. Viu que a mancha de vinho era grande e que a blusa verde quase parecia vermelha. Viu também que ele, de alguma maneira, lhe lembrava aquele seu ex que foi morar em Brasília e nunca mais lhe telefonou.
Ana ficou um tempo pensando se escrevia um bilhete para o anfitrião. “Olá, tive que ir, meu telefone é...” Não, não. Muito descarado. “Oi. Tive mesmo que ir. Me diverti muito ontem. A gente se vê.” Muito blasée. Decidiu por não deixar nada. E foi embora.
Ana sabia que ele era mais um que iria para suas crônicas, não para sua vida.
E parece que nós continuamos a viver o amor por carência. Metemos no amor tudo o que não sabemos onde meter. [ Inês Pedrosa ]
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sê magia
É verdade que, se extrairmos a vaidade desse pobre amor, resta muito pouco; uma vez privado de vaidade, ele vem a ser um convalescente fragilizado e mal pode se mover." [ Stendhal ]
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nobres ilusões
"Que algo sempre nos falta — o que chamamos de Deus, o que chamamos de amor, saúde, dinheiro, esperança ou paz. Sentir sede, faz parte. E atormenta." [ C. F. Abreu ]
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testemunhas #2
- Ahm?
- Desse seu jeito de ficar se olhando no preto dos meus olhos. Quando você acorda cedo e me olha, aí lembra que está despenteado e fica se arrumando pelo espelho que são minhas pupilas.
- É disso que você gosta? Do meu egocentrismo matinal?
- Ai, você tira todo o charme da coisa... Gosto disso, ué. Parece que tenho brilho nos olhos. Do contrário, você não iria se ver.
- Você tem brilho nos olhos...
- Tenho?
- Na verdade, todo mundo tem!
- Ai, tá vendo? Você sempre perde o momento de ser romântico.
- Não vejo nada de romântico em brilho dos olhos. Aliás, acho clichê por demais.
- O romantismo é um monte de clichê que todo mundo gosta e sempre faz efeito. Ser criativo não serve pro amor. Serve pra muitas outras coisas. Pro amor, não.
- Hmm...
- Que foi?
- Você falando de amor...
- O que que tem?
- Não sei.
- Te incomoda?
- Não. Mas me lembra que tem assuntos entre a gente mal resolvidos.
- Não tô querendo te lembrar de nada.
- Botando culpa no subconsciente? Isso não é nada criativo. Clichezaço!
- Você leva tudo pro lado do mal.
- Você leva tudo pro lado do amor. Sempre.
- Não sei qual é o problema...
- É, nem eu.
O amor é tão arrogante que não aceita virar amizade. [ Fabricio Carpinejar ]
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testemunhas #1
- ...assim como?
- Espera! Eu não terminei de falar.
- Desculpa. Vai, quando eu fico assim...
- Então, quando você fica assim, toda encolhidinha, com as mãos por entre as pernas, e as pernas, por sua vez, enroscadas uma à outra, eu sei que você tá pensando em alguma coisa pra dizer e no fim, decide por não dizer. E fica com esse seu olhar de quem quer muito contar, mas não pode. Ou tem medo.
- Isso tudo você percebe pelo jeito como me encolho? Pode ser frio...
- Não é. Não é assim que você sente frio.
- Posso estar com frio nas mãos.
- Pode, mas não está.
- Humm... Essa explanação toda é pra mostrar que você me conhece bem?
- Não te conheço bem...
- Não? E consegue entender os mínimos dos meus jeitos com uma sabedoria dessa proporção e acha que não me conhece bem?
- Você é fácil de decifrar.
- E isso é bom ou ruim?
- Depende.
- ... do que?
- Depende do que você quer dizer. Ser transparente é bom pra quem quer que te escutem, que te entendam. Ao mesmo tempo é ruim, se você quer que seus pensamentos sejam sempre mistério.
- Então eu não sou misteriosa?
- É.
- Isso faz sentido pra você? Pra mim, não faz algum!
- Porque você sempre, de algum jeito caricato, mostra que tem algo pra dizer, ou algo que você sente e te incomoda, mas não diz. A gente, eu e todo mundo, vemos em você essa catarse contida. Mas nunca sabemos o que é.
- Bonito.
- O que?
- Essa maneira como você me vê. Ou... como você mesmo diz... como me veem.
- É...
- Engraçado que...
- De novo!
- O que?
- Você não deixa eu terminar de falar!
- Desculpa.
- ...
- Diz!
- Já esqueci.
- Eu sou ansiosa.
- Eu sei.
- É, você sabe demais de mim.
- Menos aquilo que você não diz...
- ...e que me faz encolher toda. Eu sei.
Tentar entender o outro como a gente se entende ainda é não sair de si mesmo. [ Fabricio Carpinejar ]
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brilhos falsos
"E eu estava só começando a entrar num estado de amor por você. Mas não me permiti, não te permiti, não nos permiti. Pedro Paulo me dizendo no ouvido "nunca vi essas luzes nos seus olhos".
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da cor do azeviche
"Não adianta nem me abandonar... porque mistério sempre há de pintar por aí." [ Doces Bárbaros ]
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desconsidere
palavras cruas sempre virão. aprendamo-nos.
e eu me esquivo enquanto posso. enquanto devo.
ébria. que fique claro.
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pedra do mar
"Por baixo das palavras que dizes, percebo que há outras que calas." [ José Saramago ]
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tudo que venha da lua
Como tantas outras cartas que mandei e não foram respondidas - também nunca voltaram - esta é pra dizer aquilo que tu já sabes, embora desconfio que tenhas esquecido: sinto tua falta, meu amigo.
E mesmo que os problemas sejam muitos, a cerveja sempre abusiva, os livros acumulados, os amores desperdiçados, mesmo que amigos apareçam sempre - e aparecem! - ainda assim, veja só!, tua ausência se faz presente. E mais: se faz lancinante.
E como tu cantavas naquele teatro dos tempos juvenis: "como um porto, um jeito torto, beijo de garoto, um nó... como um laço de paixão... como ser um só." Viste? Não esqueci! Ainda ouço sua voz mansa, meio Camelo meio Chico, cantando aquela música feita só pra mim.
Não sei que vida tu cantas agora, só sei que do lado de cá, ando remando em mar revolto. Nunca fui muito de reclamar, mas a felicidade se amarelou como aquela foto que a gente nem tem mais, perdeu-se nas gavetas.
Quero mais dessa tua doçura efêmera. Sabia sempre, que em algum minuto imprevisto, tu ias explodir. Soltar coisas ácidas e cruas. Para, logo em seguida, voltar à doçura costumeira. É essa tua dubiedade que me fascina. Que queima num apelo desesperado para que voltes e faças vista.
Não sei que buraco o coelho te levou, mas também sei que tu nunca foste muito de seguir. Caminhos teus sempre foram muito ocultos. Mas teus medos, palavras poucas, esses sei quais são. Sem sequer precisar dizer. O que deixamos de dizer?
Amigo, a fogueira daqui queima que não suporto. Venhas logo! Tragas o frio e um pouco de mel para esse caminhar um tanto obscuro. Quero e esperneio, tu bem o sabes.
Só não pares nunca. Capricorniano, tu, és um ser em movimento.
Exitem quase 7 bilhões de pessoas no mundo, a gente se apaixona por uma delas e não quer mais trocar." [ Jostein Gaarder ]
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eterno retorno
com os braços cruzados na altura do peito.
olhos baixos como quem procura nas formigas do chão, um sentido para a espera.
é por ti que venho em madrugada tão alta que já engana: é dia.
e essa luz forte nos olhos, cega tanto quanto esse amor que nada diz.
e te digo que é bom te ver, em tom de mentira, para esconder a vergonha de uma verdade sincera.
tu não te importas. tampouco sorris.
eu tiro os sapatos. as meias. a poeira. jogo no chão o que me pesa as costas.
é o alívio que me traz quando todo esse peso vai embora.
e volta.
mas volto.
voltei pra dizer, mas se bem considero, esse silêncio nos cai melhor.
olho pra ti pedinte.
olhas pra mim recluso.
algum barulho desavisado lembra-te de que espero.
imerso em pensamentos, dizes tu.
não entendo. tu não te esforças em explicar, em agradar, em pôr alguma ou qualquer lógica nas tuas proposições.
é por ti que finjo.
sorrio complacente. digo que entendo. calço os sapatos.
esqueço as meias.
que seja! já estão velhas.
e vou andando na madrugada avessa. de volta.
e tu virás atrás.
não agora.
mas virás.
assim como eu vim. sem prelúdios.
e será assim que seremos: não-sendo.
são nossos paradoxos que nos movem.
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revés
e sinto saudade.
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amigo. no singular.
"A memória da gente é safada: elimina o amargo, a peneira só deixa passar o doce." [ C. F ]
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sobre você
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sem mais
Jogue fora quatro anos. Eu jogo fora todo o estupor.
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Para uma avenca partindo
as superfícies, enquanto eu era capaz de ir ao mais fundo, você riu porque eu dizia que não era cantando desvairadamente até ficar rouca que você ia conseguir saber alguma coisa a respeito de si própria, mas sabe, você tinha razão em rir daquele jeito porque eu também não tinha me dado conta de que enquanto ia dizendo aquelas coisas eu também cantava desvairadamente até ficar rouco, o que eu quero dizer é que nós dois cantamos desvairadamente até agora sem nos darmos contas, é por isso que estou tão rouco assim, não, não é dessa coisa de garganta que falo, é de uma outra de dentro, entende? Por favor, não ria dessa maneira nem fique consultando o relógio o tempo todo, não é preciso, deixa eu te dizer antes que o ônibus parta que você cresceu em mim de um jeito completamente insuspeitado, assim como se você fosse apenas uma semente e eu plantasse você esperando ver uma plantinha qualquer, pequena, rala, uma avenca, talvez samambaia, no máximo uma roseira, é, não estou sendo agressivo não, esperava de você apenas coisas assim, avenca, samambaia, roseira, mas nunca, em nenhum momento essa coisa enorme que me obrigou a abrir todas as janelas, e depois as portas, e pouco a pouco derrubar todas as paredes e arrancar o telhado para que você crescesse livremente, você não cresceria se eu a mantivesse presa num pequeno vaso, eu compreendi a tempo que você precisava de muito espaço, claro, claro que eu compro uma revista pra você, eu sei, é bom ler durante a viagem, embora eu prefira ficar olhando pela janela e pensando coisas, estas mesmas coisas que estou tentando dizer a você sem conseguir, por favor, me ajuda, senão vai ser muito tarde, daqui a pouco não vai mais ser possível, e se eu não disser tudo não poderei nem dizer e nem fazer mais nada, é preciso que a gente tente de todas as maneiras, é o que estou fazendo, sim, esta é minha última tentativa, olha, é bom você pegar sua passagem, porque você sempre perde tudo nessa sua bolsa, não sei como é que você consegue, é bom você ficar com ela na mão para evitar qualquer
atraso, sim, é bom evitar os atrasos, mas agora escuta: eu queria te dizer uma porção de coisas, de uma porção de noites, ou tardes, ou manhãs, não importa a cor, é, a cor, o tempo é só uma questão de cor não é? Por isso não importa, eu queria era te dizer dessas vezes em que eu te deixava e depois saía sozinho, pensando também nas coisas que eu não ia te dizer, porque existem coisas terríveis, eu me perguntava se você era capaz de ouvir, sim, era preciso estar disponível para ouvi-las, disponível em relação a quê? Não sei, não me interrompa agora que estou quase conseguindo, disponível só, não é uma palavra bonita? Sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver, e desamar era não mais conseguir ver, entende? Dolorido-colorido, estou repetindo devagar para que você possa compreender, melhor, claro que eu dou um cigarro pra você, não, ainda não, faltam uns cinco minutos, eu sei que não devia fumar tanto, é eu sei que os meus dentes estão ficando escuros, e essa tosse intolerável, você acha mesmo a minha tosse intolerável? Eu estava dizendo, o que é mesmo que eu estava dizendo? Ah: sabe, entre duas pessoas essas coisas sempre devem ser ditas, o fato de você achar minha tosse intolerável, por exemplo, eu poderia me aprofundar nisso e concluir que você não gosta de mim o suficiente, porque se você gostasse, gostaria também da minha tosse, dos meus dentes escuros, mas não aprofundando não concluo nada, fico só querendo te dizer de como eu te esperava quando a gente marcava qualquer coisa, de como eu olhava o relógio e andava de lá pra cá sem pensar definidamente e nada, mas não, não é isso, eu ainda queria chegar mais perto daquilo que está lá no centro e que um dia
destes eu descobri existindo, porque eu nem supunha que existisse, acho que foi o fato de você partir que me fez descobrir tantas coisas, espera um pouco, eu vou te dizer de todas as coisas, é por isso que estou falando, fecha a revista, por favor, olha, se você não prestar muita atenção você não vai conseguir entender nada, sei, sei, eu também gosto muito do Peter Fonda, mas isso agora não tem nenhuma importância, é fundamental que você escute todas as palavras, todas, e não fique tentando descobrir sentidos ocultos por trás do que estou dizendo, sim, eu reconheço que muitas vezes falei por metáforas, e que é chatíssimo falar por metáforas, pelo menos para quem ouve, e depois, você sabe, eu sempre tive essa preocupação idiota de dizer apenas coisas que não ferissem, está bem, eu espero aqui do lado da janela, é melhor mesmo você subir, continuamos conversando enquanto o ônibus não sai, espera, as maçãs ficam comigo, é muito importante, vou dizer tudo numa só frase, você vai ......... ............ ............. ............ .......... ........... ............. ............ ............ ............ ......... ........... ............ ............ sim, eu sei, eu vou escrever, não eu não vou escrever, mas é bom você botar um casaco, está esfriando tanto, depois, na estrada, olha, antes do ônibus partir eu quero te dizer uma porção de coisas, será que vai dar tempo? Escuta, não fecha a janela, está tudo definido aqui dentro, é só uma coisa, espera um pouco mais, depois você arruma as malas e as botas, fica tranqüila, esse velho não vai incomodar você, olha, eu ainda não disse tudo, e a culpa é única e exclusivamente sua, por que você fica sempre me interrompendo e me fazendo suspeitar que você não passa mesmo duma simples avenca? Eu preciso de muito silêncio e de muita concentração para dizer todas as coisas que eu tinha pra te dizer, olha, antes de você ir embora eu quero te dizer quê.
[ O ovo apunhalado ]
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Verde
"Tinha uma coisa muito importante pra dizer. Mas prefiro não dizê-la. Só é sincero aquilo que não se diz. (...) Só o silêncio é sincero". [ Fernando Sabino ]
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o que não tem governo nem nunca terá
e hoje, hoje mesmo, nesse exato instante me dei conta de que você não é uma moeda excepcional onde eu sorvi o mais gostoso chocolate. sim, você me deu os sabores mais ávidos, os prazeres mais primários, as lembranças mais pungentes, mas não será o único. assim como acreditei a vida inteira na sua singularidade. não há singularidade nenhuma no que você me deu, no que você deixou de dar. e você é uma moeda de um real, como qualquer uma, e não adianta eu fugir disso. não posso te fazer mais chocolate no meio desse mundo que é só moeda. e nem vou.
foi hoje. assim. do nada. hoje que vi. que percebi. que entendi. minha busca é pelo chocolate nos invólucros mais comuns. meu caminho é descascar.
“Como é que eu podia saber que aquelas rosas eram carnívoras?” [ C. F. Abreu ]
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estrela, flor, estilo
"Um homem se consola mais ou menos das pessoas que perde, mas falto eu mesmo, e essa lacuna é tudo." [ Machado de Assis ]
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remember me
"Sofrer é pouco ao amor. As lágrimas nunca serão fartas como a saliva. A saliva é a lágrima da alegria." [ Fabrício Carpinejar ]
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eu mesma silencio
"Tenho uma vontade besta de voltar, às vezes. Mas é uma vontade semelhante à de não ter crescido" [ Caio F. Abreu ]
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absinto
"(...)tenho essencialmente o espírito de Euclides: terrestre. De que serve querer resolver o que não é deste mundo?" [ Fiódor Dostoiévski ]
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o contrário
espera voltar pra saber se realmente sua memória lhe traiu. até lá!
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eu só repito
Escritos de Gaveta
Um beijo imenso a minha querida Anna Luiza por escrever tão bem ! Acho que nossa lua está no mesmo quadrante.
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carnaval de dissabores
E a menina espera. Quem sabe ele volte... Daqui há 6 anos e 10 meses, quiçá. Ela esperará. Tão errada como nunca. Como sempre.
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refazendo
O cheiro. Era um cheiro bom. Ele sorriu. Sem nem perceber, sem nem se dar conta do despropósito que é sorrir para um cheiro. Começou a mexer a cabeça como quem segue um cheiro invisível por natureza, mas não precisou. O cheiro estava ali. Por todo o ambiente. Olhou para os lados para ver se os outros, meros passageiros, também o sentiam. Estavam dormindo. E os que estavam despertos, olhavam em volta a procura do ponto certo.
Mas ele tinha o cheiro por perto. E era aquela mistura gostosa da pele dela com o cheiro do cabelo. Aquele doce amálgama de quando ela saía do banho: a pele fresquinha junto com o aroma do xampu que ela usava. Não sabia porque, mas os cremes ficavam muito mais cheirosos quando vinham do cabelo dela.
Fechou os olhos e ficou lembrando das muitas tardes em que ela desfilou reinante com seu cheiro de menina. Menina que não precisa de perfume. Menina que tem como essência seu próprio cheiro. A menina que, sem querer, tinha o elixir que o fascinava. Jean-Baptiste Grenouille, sem dúvida alguma, percorreria céus e terra atrás desse fascínio.
Lembrou-se, com júbilo e saudade - mais júbilo que saudade -, dos banhos compartilhados. Do toque secreto e sereno das mãos que queriam perfumar. De quando ela penteava os cabelos, jogando água pelos cantos, cantarolando alguma música com desafino.
Ele percebeu, contudo, com saudade e tristeza - com igual saudade e tristeza - que não estava indo visitá-la. Que não estava sequer próximo à sua casa. Que o ponto final não era sua rodoviária onde ela estaria a sua espera com algum presente escondido na mochila, sempre pesada.
E foi assim que o cheiro dela chegou, assim meio sem aviso, pra dizer que não adianta fugir. Ela estaria sempre ali. Esperando por ele.
- Cheiro é uma coisa muito doida, né?
"(...)e ao mesmo tempo, inesperadamente, depois de mais de vinte e quatro horas sem pensar nisso, e só agora percebia que, durante todo esse tempo, não fizera outra coisa senão permanecer consciente do estar inconsciente dele no meu pensamento(...)" [ Onde andará Dulce Veiga? ]
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( )
e mesmo que haja espaço, tempo, pressa, fome ou qualquer outra coisa acerba, não há mais palavra. uma só pra ser dita. nem ouvida. nem escrita. nem pensada.
amanhã é outro dia.
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inferno
Boa noite.
É, Dostoievski, você tem razão. O inferno é mesmo o sofrimento de não poder amar.
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a dor é toda minha
Soluçava. Ele trouxe um copo d'água e parou de indagá-la. Chegaria um momento que ela diria. Que confessaria o porquê do choro inesperado no momento preparado especialmente para fazê-la sorrir. A menina sentiu um arrepio que não era medo, sentiu o dissabor da descoberta de quem há muito desistiu de se perguntar. Fitou os olhos, esses sim cheios de medo, de quem estava na sua frente segurando um copo já vazio. A menina voltou a chorar. Já era tarde.
Abriu os olhos úmidos. Viu os girassóis. Ah, os girassóis... Um dia dissera que era sua flor preferida. Apesar de que toda flor a encantava, independente do tipo. Mas os girassóis, amarelos que só eles, a faziam sorrir. Não a fizeram. Haviam muitos deles pelo quarto. Ele não se contentou com uma flor. Ela merecia mais. Muitos e muitos e muitos. A menina nunca tinha ganhado girassóis, nem flor alguma. Era importante aquele monte de flores com cheiro bom. Deveria ser.
Não eram só os girassóis que eram pra ela. Ele fez uma música. Uma letra linda que falava de anjo, beleza e sorriso. Era pra ela. E o violão estava ali do lado da cadeira para fazê-la lembrar da voz mansa dele cantando. A menina se deleitou com sua canção. Primeira canção feita somente pra ela. Nunca quis uma música, mas não pode esconder tamanha surpresa deleitante em ganhar uma. Tinha esquecido a letra.
Ele a puxou pra perto oferecendo pro choro estouvado, o ombro. Ela recusou. E olhou pra baixo para não ter que ver os olhos que perscrutam. Qual era o erro daquela noite? A menina ainda podia escutar o "Eu te amo" dele ecoando pelas paredes e pela fragilidade do seus ossos. Foi um lindo eu-te-amo acompanhado de um monte de palavra goethiana que, por si só, a encantariam. O encanto não se perdeu. O encanto simplesmente não apareceu.
E tudo que ela sempre quis eram flores, declarações de amor e um beijo doce. E havia ali, mais do que ela sempre quis. Qual era, então, o motivo do choro da menina na noite sem estrelas? Na noite feita para que ela brilhasse? A menina, fosca, sabia bem que a noite não era sua. E que o perfume dos girassóis também não vinha dela. A menina queria que ele entendesse que o problema é que o amor não era dele. Eram olhos de quem esperava amor, muito amor, os dele. Mas ela não tinha.
Todo seu amor, por mais que ela guardasse e escondesse, era de quem se foi. E foi. E não volta.
Não disse nada a menina. Seu pranto já era sua perdição.
"chegou-se a discutir qual a metade mais bela. nenhuma das duas era totalmente bela. carecia optar. cada um optou, conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia." [ carlos drummond de andrade ]
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