Os pecados são todos meus

domingo, 12 de julho de 2009 às 23:59
Era tempo de limpar as gavetas. Uma a uma. Mas resolveu começar pela velha gaveta de badulaques. Aquela que guardava o sonho de uma vida melhor. De amores antigos. De doces lembranças.

Ali mesmo, vendo o amálgama de coisas que guardara. Viu que não possuía amores antigos. O que possuía era o mesmo amor partido em muitos outros. A mesma pessoa que amara, fazia anos, três, quatro? Quantos mesmo? Perdeu a conta... Esse mesmo amor que de tanto se transformar se perdeu na sua origem... Que palavras de outrora ainda perduram no fogo singelo de hoje?

Olhe... aqui no fundo... A primeira carta. A única, porém a mais importante que já ousou receber! Veio junto, como um presente merecido, um desenho especialmente tecido. Foi por tantos anos seu principal papel no quadro de seu quarto! Era lindo. E a carta, não ousou reler mais. Andava fraca do coração... Mas não se esquecia que era linda e trazia uma contagem regressiva para o dia que seria o primeiro encontro.

Ah, o primeiro encontro... Aqui está, olhe só! O bilhete da passagem pro dia 20 de janeiro de 2007. Guardadinho... O dia em que mais suou de nervoso na vida. Como desejou dentro daquele ônibus frio ser quem ele esperava! Como pediu para que aqueles dias, onze dias, nunca acabassem... E não acabou. Está dentro dela! Mais vivo que nunca. Sim, perderam-se pelo caminho, mas as lembranças guardadas na gaveta do seu quarto, jamais se perderam também na gaveta da memória.

E o anel feito de sonho de valsa. Chora não, menina! O pedido de casamento foi para que nunca se esquecesse como é bom ser desejada a ponto de ser ir além. Foram além. Foi-se o além. Mas está ali. Aquele anel dado sem bonitas palavras, mas com o ardor dos olhos negros. Os olhos negros... achou ela, no meio de uma antiga caixinha uma foto da sua viagem para cá. Ainda cheia de areia da praia, a foto trazia o amor que ninguém nunca viu, mas que eles sentiram como se fosse a razão de tudo. E era. Viveram por ele. Mesmo que, mortos, os dois andem a procurar o que restou. "Que lindos cachos eu já tive só pra mim..." Eram lindos, como de anjos.

E como um anjo que pede um sorriso... o livro. Um livro com uma dedicatória que não fala de amor, mas fala do que jamais vai se apagar: uma linda história. "Uma história extraordinária", ele escreveu. Como ela se agarrou a esse presente na fria viagem de volta! Como queria que ele fosse a salvação do mistério do desprezo que ela se afogava!

Fechou a gaveta. Não podia e nem queria jogar fora aquelas lembranças! Seriam elas a cura de feridas criadas pela incompreensão? Acendeu um cigarro e pensou que seria o momento ideal para o telefone tocar. Diria "eu te amo" de uma maneira visceral que sairia mais como um grito do que como um lamento. Diria "não me deixe nunca!" como uma súplica de quem não quer se deixar morrer. Diria tanto e muito que não ouviria a pergunta do "vai ou não vai em tal lugar?" porque não queria ouvir perguntas, queria ouvir as afirmações mais apaixonadas que durariam madrugadas de muitas confissões.

Diria...

Todo o meu subjetivismo

quinta-feira, 9 de julho de 2009 às 13:57
"Com o tempo aprendi que o ciúme é um sentimento para proclamar de peito aberto, no instante mesmo de sua origem. Porque ao nascer, ele é realmente um sentimento cortês, deve ser logo oferecido à mulher como uma rosa. Senão, no instante seguinte ele se fecha em repolho, e dentro dele todo o mal fermenta. O ciúme é então a espécie mais introvertida das invejas, e mordendo-se todo, põe nos outros a culpa da sua feiura. (...)"

[ Leite Derramado / Chico Buarque ]

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