Persival Dutra estava empolgadíssimo. Arrumou a mala, a única que tinha, já rasgada aqui e ali e selecionou suas melhores roupas. Deixou pra trás aquelas que não fossem tão boas quanto o destino que se seguia. Dias antes, recebeu um telefonema chamando-o para trabalhar na Rádio Guanabara. Ah, o Rio de Janeiro... Como sempre ansiou conhecer essa cidade das mais belas músicas que anunciava! Agora iria ser um locutor de sucesso na cidade onde tudo acontece! Persival Dutra estava tão empolgado...
Em abril de 1958, ao chegar no Rio, instalou-se num quartinho alugado na casa de seu Ananias. Era uma casa simples no subúrbio da cidade, mas por ora estava bom. Enquanto preparava sua voz no banheiro contíguo, Persival viu um vulto pela janela. Pôs se a olhar. Era Leda da Rocha, filha de seu Ananias. Era baixa, de curvas largas e fartos seios, possuía bochechas rosadas e um sorriso automático. Sorriso este que, mais tarde, descobriria que sempre viria com muitos palavrões.
Leda era desbocada e independente. Embora muito nova, saía falando sobre todos os assuntos, sem filtro algum. Caçoava das pessoas, mesmo daquelas que não conhecia. Defendia o pai com unhas e dentes e se pusessem a falar mal dele, ela soltava os palavrões. Pois não houve remédio: Persival ficou perdidamente apaixonado por Leda. Embora bem mais nova e mais cheia que as meninas da sua idade, ele não pode conter a atração que ela exercia. Era tão solta!
Passava os dias a observá-la. Ela espiava por vezes, mas sequer lhe dava atenção. Não fazia o seu tipo. Mas Persival não desistia. Fazia-lhe poesias que ela aceitava de bom grado. Dizia que eram muito bonitas, depois jogava fora e saía a andar com seu jeito desdenhoso. Dedicava-lhe músicas na rádio que ela vivia cantarolando pelos cantos da cozinha, mas, geniosa, nunca agradecia.
Um dia, Leda se arrumou toda para o show do Cauby Peixoto que ia ter no teatro próximo. Persival ardeu de ciúmes. Puxou-a no canto e proibiu-a de ir. Disse que ela era dele e de mais ninguém, e que esses concertos não eram apropriados para uma menina como ela. Ela riu-se alto e provocador. Mal deu-se o trabalho de responder. Saiu andando para encontrar as amigas.
Leda, no meio do show foi chamada às pressas pelo seu irmão. Algo de muito grave tinha acontecido! Saiu enjuriada porque iria perder metade da apresentação, mas foi então que seu irmão falou apressadamente: Persival tinha tentado se matar! Mas o que ela tinha a ver com isso, oras? Fora do teatro, seu pai já a esperava no carro para levá-la para a casa de sua tia. Comunicou, por fim, que Persival tinha deixado um bilhete que falava no nome dela.
Leda nunca soube realmente o que havia escrito no bilhete. Sua mãe ao ver tamanha desgraça rasgou e queimou-o imediatamente. Soube, contudo, que Persival fracassou ao cortar os pulsos. Não morreu. E foi expulso da casa de seu Ananias. Leda ficou um bom tempo escondida na casa dos tios. Tempos depois, Persival mudou-se para perto dela e volta e meia parava-a na rua para lhe dizer de amor e morte. Leda nem ligava! Soltava o braço e saía a andar displicentemente pela rua soltando palavrões e risadas estrondosas.
Em homenagem à minha avó Leda com suas histórias reais sempre com muito sabor.
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Aqui em casa quem conta história é o Vô (Zé).
E você aprendeu muito com a Vó Leda.