são as palavras que me empurram

terça-feira, 18 de janeiro de 2011 às 12:03
Uma ligação me desestabiliza. Estava eu, serena e lúcida, lendo Althusser, sublinhando frases de efeito e dignas de serem ressaltadas, quando me chega um ruído. O celular. O vibrar de alguém que do outro lado dos pontos cardeais lembrou-se de mim. Antes não tivesse. Uma ligação seca. Fria. Áspera. Ocre. Não sei quantos mais adjetivos posso usar, mas serão sinônimos inúteis. Um oi, tudo bem, eu vou bem, lembra-daquele-livro..., não, não lembro, ah, vou-procurar-na-internet, então, beijo, tchau. Assim. Sem mais. Sem uma preocupação saliente. Uma inquietação próxima de algo bonito chamado saudade. Uma demonstração pequena que fosse de amor ou de afeto. Não sei se é o telefone que te muda, mas você mudou. Tá seco, frio, áspero, ocre ou o que seja! Diferente. E me dói um pouco aqui, não sei bem aonde, se na cabeça ou no coração, ou se em um pouquinho dos dois, ver você assim diferente. Ou o que queria dizer era distante? Pode ser que na volta você volte com acalantos e amores proclamados, mas o pode ser inquieta-me por demais e, posso contar?, to velha demais pra tamanhas inquietações. Tô sim. Não dou mais pra essas incertezas juvenis. E, na verdade, me condeno por todas essas elucubrações se esse é você, se é outro, ou se é você querendo ser outro e não me querendo mais. Seja lá quem for, seja lá como for, eu guardo pra mim esse medo que dói – umas pontadas, sabe? – e não deixo você saber de como você atrapalha meu dia com seu ar frio. Deixo umas indiretas aqui e ali, mas quando você pergunta, desconverso porque sou sim feita de pensamentos. E bem que eu poderia continuar minha vida ociosa de férias de janeiro, lendo, sublinhando, vendo documentários de esquerda, se não fosse suas ligações que não dizem nada. Pelo menos você ainda liga. Ainda lembra. Embora nada diga de muito importante. Agora não dá mais pra voltar pro livro, mal consigo ver e me concentrar no que quer que apareça. Essa pessoa que me desconcerta e me tira o casaco. Não me ligue mais.


"...de que serve sonhar um momento, se a realidade da vida é ruim. Existem forças muito fortes, separando você de mim..." [ William Shakespeare ]

1 Responses to são as palavras que me empurram

  1. Inquietante.

    As vezes tudo está sob controle, mas a simples falta de palavras eficazes [o silêncio] fere mais que palavras ditas ao léu.

    Um beijo, Larissa.

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