Cores perplexas

sábado, 14 de fevereiro de 2009 às 20:18
Estava serena, no entanto. E se assustou com a descoberta. Foram tantas vezes que chorou, quebrou pratos, chutou cadeiras, gritos pela janela, foram tantos destemperos que, incrédula, percebeu uma calma insuspeita. Tinha descoberto os desenhos, as cores, o rabisco dos sorrisos alheios provocando o seu próprio. Cada cor trazia uma lembrança fresca da infância que passou se perguntando. De todas as crianças, era a mais curiosa. Tudo estava sempre incompleto porque não havia explicações. Ou tudo era muito bem explicado para parecer real. E agora, já feita de desenganos e caminhos tortos, descobria todas as respostas que sempre procurou, mas perdia tempo demais perguntando. Era assim: a resposta vinha naturalmente. O cenário em volta era o mesmo de muitos anos, mas a menina ali era outra. Naquela cama, tinha dormido alguém além dela mesma. Alguém que não a esperou reinventar-se. E ela se reinventava. Com cores diferentes. E contornos cada vez mais firmes. Era o tempo ou era a falta? O buraco do mundo também era seu. E ela olhou na estante, a bruxinha do amor verdadeiro, que tava com sua vassoura em riste faziam três anos. Disseram, um dia, que era para tirar a vassoura e só devolver quando encontrasse o amor genuíno. Pensou em tirar, mas desistiu. O amor se foi, mas isso não significa que nunca existiu, não é? Sem perguntas. Ela estava farta das perguntas que lhe tomavam o tempo das descobertas. A paz era sua prenda agora. Sua prenda eterna.


“...paixão tão endemoninhada que não suportaria a água benta de seu próprio batismo” [ c. f. abreu ]

1 Responses to Cores perplexas

  1. Anônimo Says:

    Obra corrente, sóis rabiscados,
    sombra espalhada a golpes de lata,
    Alma esufamaçada no artista insólido.
    Derrete ao calor de fevereiro
    o branco dos dentes a mostra.
    Mantém-se no princípio e no pano.
    Solvente aberto a um passo do fim,
    ralo nanquim para a vaidade impressa.
    Não é esse o findar da peça?
    Obra aberta.

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