Prefácio

sábado, 24 de janeiro de 2009 às 23:21
Às vezes penso na nossa história como um livro de gravuras. Às vezes me confundo com uma criança que folheia o livro, sem lê-lo, só procurando desenhos. Eu, quando criança, procurava livros só pelo prazer de olhar as fotos. Mas aí eu percebi que a maioria dos livros não possuem fotos, só letras. Uma do lado da outra, do lado da outra, do lado da outra, espaços, e letras e frases e... quantas páginas com esse amontoado de letras! Foi então que passei a ler todos os livros que eu encontrava com o intuito de entender qual é a graça que tem um livro sem figuras! Deveria haver alguma, é claro, senão não existiriam. E havia. Havia cada um a sua graça. O seu encantamento. E passei, assim, a evitar os livros com desenhos. Limitavam a minha imaginação. Gostava de imaginar quem era Ursula Buendía ou como era o sorriso do gato de Cheshire ou como era feio o rosto de Macabéa, como seriam os diferentes jeitos de Viramundo. Imaginava um Dorian Gray só meu. Uma Capitu de olhos bem grandes para que merecessem ser citados com tanta ênfase. E passei a criar não só personagens lidos como a criar a minha própria personagem: eu. Cada livro me fazia com que eu me distanciasse mais do que eu era antes. Passei a ser não somente múltiplas pessoas em mim como pessoas diferentes a cada época, por mais que eu me olhasse no espelho e visse sempre a mesma menina de cabelos desgrenhados. E passado o tempo, eu vejo nossa história de amor como um livro que não tem palavras, só gravuras. E me vejo aquela criança que costumava ser, olhando nossas fotos, uma a uma, virando a página e entendendo como por mágica a história que era pra ser contada. Não precisa ser escrito aquilo que já foi vivido. Nem preciso viver aquilo que já foi escrito. Só queria virar a página dessa foto preto-e-branco. Não me agradou, não senhor! Criança ávida que sou, quero logo saber como esse livro todo desenhado por nossas mãos vai terminar! Se for terminar...

"...através de silêncios mal tecidos e palavras inábeis, pobre coisa sedenta, te feres, exigindo o poço alheio para saciar tua sede indivisível." [ caio fernando abreu ]

1 Responses to Prefácio

  1. Psique. Says:

    tanto orgulho da sua escrita, irmã, tanto orgulho que tenho...

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