Sonhos despenteados

quarta-feira, 25 de março de 2009 às 22:14
Era sempre o mesmo sonho. Ela correndo. Correndo. Correndo. Correndo. Às vezes era dia, com o sol forte queimando os ombros, cegando a vista. Noutras, era noite, na escuridão dos becos e esquinas sujos que ela passava. Mas estava sempre correndo. Eufórica, medrosa. Tropeçava nos próprios pés ao olhar pra trás. Olhava e não via ninguém. Mas fugia. Sempre. O medo no rosto, a esperança nos pés.

Fechou os olhos. Cansada da madrugada alta. O descanso merecido. E o sonho começou. Novamente os pés em movimento, ela corria. Já conhecia bem as ruas, as casas, suas feições agitadas, o cansaço. Não entendia porquê sempre o mesmo sonho. Não entendia porquê sempre correndo, sempre fugindo. Não entendia de onde vinha, pra onde ia, de quem se escondia.

Antes de acordar, lá no final da rua já tão lembrada, ela viu. Não estava fugindo. Estava buscando. E bem lá no fim, de braços abertos, com o sorriso maior que existe no mundo, com uma blusa preta com uma coroa dourada na frente, uma guitarra nas costas, cachos pretos penteados e um coração transbordando carinho, estava ele. Era ele quem a esperava. Era ele por quem ela ansiava nos passos fortes das suas corridas. Era pra ele que ela percorreu todo o percurso do medo, da fuga. Para se encontrar. Para o encontrar. Para chegar. E chegou. Destino final: o abraço eterno.


“Tenho um amor fresco e com gosto de chuva e raios e urgências. Tenho um amor que me veio pronto, assim, água que caiu de repente, nuvem que não passa. Me escorrem desejos pelo rosto pelo corpo. Um amor susto. Um amor raio trovão fazendo barulho. Me bagunça. E chove em mim todos os dias.” [ Caio Fernando Abreu ]

1 Responses to Sonhos despenteados

  1. Anônimo Says:

    do outro lado da rua o calor e o cheiro óleo diesel castigavam. havia mais que a espera, havia a ansia. vontade desmedida daquele short xadrez, da madrugada de choro cumplice e redentor. havia alí naquele olhar, margiado de sorriso, a espera de um abraço, de um calor corpóreo nas tardes intermináveis debaixo da água do banho. havia a vontade do silêncio forçado das noites segredosas.
    o cheiro do mar lhe impressionava toda a vez que ela pisava ali, muito longe da praia. a cor do sol, do mel, da rede balançando em tardes preguiçosas lá de longe. eram feitos um para o outro. o mar e o céu. totalmente distintos, por natureza. mas onde um terminava, o outro vinha azul brilhante clareado em raios de sol.

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