"Que tempos difíceis eram aqueles: ter a vontade e a necessidade de viver, mas não a habilidade." [ Charles Bukowski ]
o reencontro
domingo, 12 de janeiro de 2014
às
20:19
te vejo chegando, um pouco mais magro, com o cabelo ralo, as costas curvas. você atravessa a rua, olhando pro chão, sem pressa alguma, sem se dar conta de que aquele momento era uma rota desviada do caminho que as nossas vidas seguiram. levanto da mesa, um pouco tonta, um pouco ébria, com os olhos fixos em você. você chega, enfim, levanta os olhos caídos e sorri. ah, esse sorriso que me roubou a sanidade por tanto tempo estava ali me desafiando outra vez! penso em sorrir, penso em dizer 'oi, como vai?', penso em correr dali o mais rápido possível, penso em gritar e chorar de raiva e de revolta. penso. mas não adianta pensar quando alguma coisa totalmente irracional mexe seus braços e pernas e de repente eu me lanço e te abraço. você se assusta. o abraço inesperado. o abraço do reencontro, das pazes. abraço, penso eu, para esconder as muitas lágrimas que me caem e não saberia jamais explicar porquê. mas abraço muito mais para me refugiar desse tormento que foi esses tantos anos a te odiar. te arranho as costas e com toda força te aperto porque é agressivo esse meu jeito de te pensar. sinto na sua nuca um cheiro diferente e vejo que apesar do abraço, todo o resto mudou. até a cidade. depois da catarse, nos sentamos ao cheiro do meu café frio e do seu cigarro recém aceso. comento que emagreceu, você culpa o cigarro. pergunto por que resolveu cortar os cachos, você lembra a idade. falo que está curvado e pergunto dos pesos que anda a carregar. você começa a falar das mudanças, das tristezas e dos sonhos. eu não escuto porque a fumaça do seu cigarro me faz pensar no incenso de mirra que senti quando nos vimos pela última vez. quando nos separamos de vez. eu olho pra você e lembro daquilo que me dói e penso em sair. sou exatamente dessas que foge. você fala. eu não escuto. só penso. só penso.
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